quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Comentário leviano sobre a música

Há duas semanas, enquanto trabalhava no banco de dados de minha pesquisa de mestrado, sintonizei, como de hábito, a Rádio Cultura. Por volta das 16h, foi com satisfação que ouvi o programa Pergunte ao Maestro, com o simpático João Maurício Galindo. Ele respondeu à pergunta de um ouvinte sobre se o rock progressivo poderia ser considerado música erudita. Gostei da resposta («depende», disse ele), mas não foi propriamente ela que me chamou atenção. Fiquei curioso com a afirmação de Galindo de que, no que diz respeito a rock progressivo, bandas como Yes faziam música para ser apreciada. «Ora», alguém poderia dizer, «acaso algum músico faz música para que as pessoas não a apreciem?» Não exatamente. O que Galindo quis dizer, se bem o entendi, é que, até algumas décadas atrás, mesmo algumas vertentes da música popular eram elaboradas de tal modo a que as pessoas fossem aos shows com o único objetivo de ouvi-las. As pessoas iam a shows de banda de rock progressivo com a mesma disposição de quem vai ao show de uma orquestra de câmara: ir para ouvir música.

«E por um acaso», perguntam-me meus botões, «e por um acaso alguém vai a um show para alguma razão que não seja ouvir música?» Sim, eu sei, pode parecer incrível e chocante. Mais la vérité, meus amigos, l’âpre vérité, é que, hoje, ouvir música é provavelmente a quarta ou quinta razão pela qual alguém vai a um show de música popular. Tudo bem, alguém poderia dizer que, na década de 1970, as pessoas iam a shows de rock progressivo para se drogar, e, por tabela, ouviam música. É provável. Ademais, muitas bandas atuais de música popular ainda têm públicos que vão a shows apenas para ouvir música. De fato, devem existir muitas.

No entanto, isso não muda o fato de que, hoje, há um número proporcionalmente maior de bandas de música popular cujos shows são freqüentados com outros objetivos que não o de ouvir música. E que objetivos são esses? ‘Pegar alguém’, ‘encher a cara’, usar drogas, dizer que esteve no show, ver um ídolo, etc. Convenhamos: quem freqüenta festivais como SWU, Rock in Rio, Festival Natura ou qualquer coisa do gênero, não vai exatamente para ouvir música. Se fosse para ouvir música, colocava o disco da banda no toca-discos e ouvia. Mas não. Atualmente, na lista de preferências da pessoa que freqüenta um festival de música, ouvir música é a quarta ou quinta preferência.

«E o que você tem a ver com isso?», perguntam-me meus incrédulos e indignados botões. Bem, nada. Sou apenas um velho ranzinza. Mas acho interessante constatar o rebaixamento cultural de nossa época. Se as pessoas se dão ao trabalho de ir a festivais, compram ingressos caros, enfrentam filas, instalam-se a centenas de metros do palco, não enxergam direito a banda, ficam de pé, para não falar nos problemas técnicos típicos desses eventos, é porque não estão lá pela música. Isso não é um problema, que fique claro. O problema, se há algum, é que tantas bandas se conformem com isso, e aceitem que seus shows sejam eventos para os mais diversos fins, menos para ouvir música.