Le plus médiocre libertin a révê des sultanes; chaque notaire porte en soi les débris d’un poète.
Flaubert, Madame Bovary.
Flaubert, Madame Bovary.
Não vejo como Madame Bovary, de Flaubert, possa ter sofrido tentativa de censura com base em «ofensas à religião», como de fato o foi no início de 1857. Considerada em seu conjunto, a obra é muito mais uma apologia da vida religiosa do que o contrário. Um casamento com um homem medíocre, uma vida burguesa insípida, uma vila onde tudo permanece como está, o olhar melancólico de Emma Bovary para tudo o que lhe cerca faz com que ela devaneie com «verdadeiros» amores, vidas intensas e adultérios. É forçoso reconhecer que, de seu ponto de vista, a maior parte das vidas – seja na metade do século XIX, seja atualmente – se enquadraria nesse quadro que compõe a sua própria. Autrement dit, a insatisfação de Emma não provém de sua própria vida: a grande maioria das outras – para não dizer todas – a deixaria igualmente insatisfeita. A obra não fornece poucas passagens que confirmem este argumento.
Emma não é diferente das outras pessoas. Como ela, todas querem ser felizes. Em algum grau, todas acreditam em algum momento que ao se casar de novo encontrarão a verdadeira felicidade, que se vivessem uma vida intensa ao invés da vida supostamente medíocre que têm de aguentar seriam muito mais satisfeitas. Todos nos descontentamos e imaginamos vidas melhores e, em algum grau, fazemos besteiras iludidos pela felicidade, que parece dar um passo a cada passo que damos para alcançá-la. A personagem de Flaubert apenas deu mais passos do que a maior parte de nós.
Por isso mesmo, ela resta como um ótimo exemplo. Todos pensamos em fazer o que ela fez e, bem, podemos ao menos ver o que lhe acontece no final: infelicidade atroz, dívidas e suicídio.
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