O século XIX pariu o homem-massa. Que aspectos apresenta a sua vida? De início, uma facilidade material incrível. Diz o autor: «O homem médio de qualquer classe social encontrava o seu horizonte econômico mais alargado de dia para dia. Cada dia acrescentava um luxo novo ao repertório do seu standard vital. Cada dia a sua posição era mais segura e independente do arbítrio alheio. O que antes se teria considerado um benefício da sorte que inspirava humilde gratidão ao destino, tornou-se um direito que não se agradece, mas se exige. (...). A essa facilidade e segurança econômica acrescentem-se as físicas: o comfort e a ordem pública. A vida corre sobre cômodos carris, e não há verossimilhança de que intervenha nela algo de violento e perigoso.».
A vida se apresentou a esse homem como que isenta de impedimentos. Mesmo a vida pública não lhe oferece limitações. Todos os homens são legalmente iguais. Esse cenário, concebido pelo século XIX, possui três princípios fundadores: democracia liberal, experimentação científica e industrialismo, os dois últimos podendo se resumir à técnica.
O mundo que rodeia o homem-massa não lhe limita em nenhum sentido, não lhe põe contenção alguma, pelo contrário, atiça seu apetite e lhe faz crer que tudo será ainda melhor no futuro. O mundo de fins do século XIX e início do XX não tem só perfeição e amplitude, mas sugere a seus habitantes enorme segurança sobre seu futuro: amanhã o mundo será ainda mais rico e mais amplo. O homem-massa, ao se deparar com este mundo tão perfeito e ao pensar que amanhã ele será ainda melhor, imagina que a própria natureza o produziu, ignorando todos os esforços pressupostos à sua criação. E como isso se reflete na psicologia do homem-massa? Ortega y Gasset aponta dois traços: a livre expansão dos seus desejos vitais e a ingratidão radical pelo que tornou possível a sua fácil existência. Esta é, diz o autor, a psicologia do menino mimado.
Pergunto então aos meus já fatigados botões: o que faz com que tantos jovens de classe média vociferem contra a Igreja no recente episódio de Alagoinha? A maior parte nem mesmo é católica. Estariam eles tão seguros de que um feto não é um ser humano? Saberiam eles dos reais riscos que a menina de 9 anos corria devido à gravidez? Meus botões, é certo, consideram minhas perguntas indiscretas e sem qualquer cabimento, não vendo nenhuma relação entre a psicologia que motiva esses jovens e aquela própria ao homem-massa. E tem mais, dizem-me meus botões, os jovens que vociferam contra a posição da Igreja não são meninos mimados, a despeito do que eu queira insinuar. Que fique muito claro, dizem eles, não há qualquer relação entre um menino mimado e um jovem que enxerga num par de fetos um presente incômodo, a que se pode aceitar ou rejeitar, como lhe convier.
2 comentários:
Hey, agora que me dei conta da existência do blog!
Passa na livraria estes dias para a gente conversar, da última vez não deu pra falar nada.
abçs.
dionisius (o ex-chefe)
Hm, os que vociferam rutilosos contra a Santa Madre esquecem-se de dois pressupostos: obediência e livre-arbítrio.
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